Recentemente, após o
falecimento do meu pai, recebi a solidariedade de vários amigos. Ouvi muitas
palavras de conforto, como, por exemplo, “ele agora vai poder descansar”, “...
não vai mais sofrer” e, principalmente, “... não vai mais ter que aguentar a
sua mãe”. E aí, influenciado por esses argumentos e por uma frase do Woody
Allen que diz que morrer é uma boa forma de reduzir as despesas, comecei a
achar que partir desta para uma melhor
seria um ótimo negócio.
Pensei um pouco e concluí
que já tinha cumprido minha missão neste mundo. Já tinha um filho – aliás,
maravilhoso – e já tinha publicado um livro – aliás, mais de um. Só faltava
plantar uma árvore...
Concluí ainda que todos os
momentos extraordinários da minha vida já tinham acontecido e que as emoções
que eles me proporcionaram jamais se repetiriam. Vi o Mengão aplicar 6 a 0 no Botafogo – a este jogo
eu fui -; assisti a Um corpo que cai,
do Hitchcock, no agora extinto cine Veneza; ainda adolescente, li Dom Casmurro, de Machado de Assis;
estive presente num show do Tom Jobim na praia do Arpoador; peguei o autógrafo
do Woody Allen; e fui testemunha dos primeiros passos do meu filho, logo depois
de completar um ano de idade, na sala de nosso apartamento.
Mas eis que acontece, na
última quarta-feira, o jogo entre Santos e Flamengo, na Vila Belmiro. Aos 25
minutos do primeiro tempo, o time carioca já perdia por 3 a 0. O que podíamos esperar
naquele momento? Nada além de dor, desespero e humilhação. Mas, como a toda a
humanidade já sabe e comenta, de forma heroica viramos o jogo e vencemos por 5 a 4, com uma atuação
espetacular do Ronaldinho. Na hora do quinto gol, quase meia-noite, abri a
janela e gritei tanto que devo ter acordado o general Waldick, meu adorável
vizinho do 505. Espero que sim. (Não sei por que time ele torce, mas, garanto,
Flamengo ele não é.)
Como explicar o que senti
naquela noite inesquecível? Tenho que recorrer ao Bruxo do Cosme Velho. Em Brás Cubas ,
Machado nos mostra como descalçar botas apertadas é um caminho infalível para a
felicidade. Pois é, a euforia rubro-negra não teria sido tão gigantesca se o
sofrimento prévio não tivesse sido tão descomunal. Eu não teria ficado tão
feliz se não estivesse tão triste antes.
E eu, que acreditava que não
poderia mais viver momentos tão extraordinários, descobri que estava enganado.
Quando terminou o jogo, resolvi fazer o que sempre fazia após as vitórias do
Mengão: telefonei para o meu pai para dizer simplesmente “saudações
rubro-negras”. Eu sabia que ele não estava mais lá para atender, mas... ser
Flamengo é acreditar no impossível!
29/07/2011
Muito, muito bom!
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