Ao longo de minha vida,
apaixonei-me por diversas mulheres – entre elas, a Scarlett Johansson -, por um
livro – Dom Casmurro, de Machado de
Assis -, por uma canção – Chovendo na
roseira, de Tom Jobim -, por um time de futebol – nem preciso dizer qual –
e por um filme.
Um
corpo que cai (Vertigo, no original) é o meu filme
favorito. Para começo de conversa, é dirigido por Alfred Hitchcock, meu
cineasta preferido. Mas não o considero apenas o melhor filme do velho Hitch. Um corpo que cai, para mim, é o melhor
filme de todos os tempos.
Assistir a Um corpo que cai pela primeira vez foi
um momento mágico, inesquecível. Isso foi em 1984 e tinha eu uns dezenove anos.
Já era fã do Hitchcock e já tinha assistido a Psicose, Intriga
internacional, Os pássaros, Janela Indiscreta, entre muitos outros.
Não imaginava, então, que o mestre do suspense pudesse ter feito algo ainda
melhor. Mas fez. O filme estava passando no antigo cinema Veneza, em Botafogo,
que não existe mais. Fui com meu amigo de adolescência Heraldo, meu amigo até
hoje. Lembro-me de que saí do cinema extasiado, inebriado, como se estivesse
ainda dentro de um sonho. Preferi retornar para casa a pé, embora tivesse que
andar uma boa distância – e ainda atravessar um túnel -, para que a transição
de volta para o árido e cruel mundo real pudesse ser mais lenta e, assim, menos
brutal.
Quando Um corpo que cai foi lançado, em 1958, não fez muito sucesso, nem
de crítica nem de bilheteria. Todavia, décadas depois, é figurinha fácil nas
listas dos dez maiores filmes de todos os tempos. O que tem de tão especial
nesse filme? Não sei explicar bem, para mim é algo muito pessoal. Não importa
quantas vezes eu o tenha visto - pelo menos uma dúzia até agora -, sempre fico
emocionado quando o revejo. Recentemente, eu estava participando de uma
mesa-redonda, sobre cinema e saúde mental, quando uma colega, em sua
apresentação, exibiu em vídeo a cena do suposto suicídio da suposta Madeleine
(Kim Novak), supostamente saltando do alto da torre na antiga aldeia espanhola.
Ainda bem que as luzes estavam apagadas e ninguém percebeu meus olhos marejados
– eu suponho.
Mais do que um filme de
suspense ou de mistério, Um corpo que cai
é uma história de amor. Foi impossível para mim – e, penso eu, para qualquer
espectador – não me apaixonar por Kim Novak e não me identificar com o
voyeurismo de Scottie (James Stewart). Claro que o amor de Scottie por
Madeleine é patológico, doentio e triste. Ele se apaixona por alguém que não
existe, Madeleine, e se recusa a gostar da mulher real, Judy (também Kim Novak).
E, além disso, tenta transformar a mulher real na idealizada, dando uma de
Pigmalião, que, na mitologia grega, esculpiu a mulher perfeita e ainda se casou
com ela.
A mensagem pessimista é que
talvez toda paixão amorosa seja assim, um estado psicótico em que projetamos no
outro somente coisas boas. Depois nos casamos com o ser amado e logo
descobrimos que nada daquilo era real. Será que Pigmalião pediu a Afrodite que
transformasse Galateia de novo em estátua, porque esta não parava de falar?
Será que Pigmalião e Galateia acabaram se divorciando? Será que eu enjoaria da
Scarlett Johansson?
A mensagem otimista é que
Kim Novak era linda, Hitchcock era um gênio e Um corpo que cai será sempre um grande filme!
13/11/2011
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