Recentemente, uma colega
acessou meu blog e comentou que as crônicas ali postadas pareciam não terem
sido escritas por mim. Segundo ela, os textos eram tão diferentes do meu modo
de ser que era como se eu tivesse outra personalidade. Minha cara, você matou a
charada! De fato, não sou o autor de nada daquilo. Todas as crônicas, acredite,
foram psicografadas. Sim, vez por outra, uma alma de outro mundo, um espírito
zombeteiro, invade meu corpo e o usa para escrever todas aquelas bobagens.
Gostaria de deixar bem claro
que, diferentemente do que aparece nas crônicas, sou um homem muito sério,
extremamente religioso e temente a Deus. Não torço por nenhum time de futebol e
nem sei quais são as cores da camisa do Flamengo. Nunca ouvi falar nessa tal de
Scarlett Johansson e só tenho olhos para a minha linda esposinha, de quem
jamais me divorciaria. Amo minha mãe e adoro todos os meus colegas de trabalho
e vizinhos, especialmente o general Waldick, do 505. (Na verdade, nem existe um
quinto andar no meu edifício. Por uma incrível falha de engenharia, na
construção do prédio esqueceram-se do quinto andar e colocaram o sexto
imediatamente acima do quarto.) Não vejo a menor graça nos filmes do Woody
Allen e só assisto a documentários científicos. Continuo acreditando que a
psicanálise, principalmente a lacaniana, é a solução para tudo e para todos, e,
apesar de a minha terapia ter sido muito bem-sucedida, ainda vou às sessões
oito vezes por semana. Por fim, nunca tive Facebook e... odeio escrever!
O problema é que, de uns
tempos para cá, o espírito não tem se contentado mais em apenas me fazer
escrever as crônicas. Ele agora tem também assumido o controle sobre meu corpo
e minha mente nas mais diversas situações. Assim, meu querido amigo, não fique
magoado comigo por eu tê-lo chamado de “careca arrogante, estúpido e sem
escrúpulos” e, em seguida, tentado estrangulá-lo, até ser contido por vários de
nossos colegas. Quando fiz isso, eu não era eu. O que aconteceu foi que o
espírito tinha se apossado de mim.
Novamente eu não era eu
quando, vestido com uma camisa rubro-negra, entrei no meio da torcida do Vasco,
em São Januário, gritando um monte de impropérios e fazendo gestos obscenos.
Era tão evidente que eu estava fora de mim que os vascaínos nem se incomodaram
comigo e ficaram totalmente indiferentes ao meu comportamento. (Portanto, foi
inteiramente desnecessária e despropositada a intervenção dos 117 policiais
militares, que, me agarrando pelos braços e pernas, muito gentilmente me convidaram
a me retirar.)
Eu também estava sob o
domínio do espírito maligno quando, num bar em Fortaleza, após meia dúzia de
chopes, subi na mesa e comecei a fazer strip-tease,
enquanto cantava os maiores sucessos de Carmen Miranda. O mesmo se deu no
episódio em que, no meio de uma aula de psicopatologia que eu ministrava, para
espanto de toda a classe, pulei para cima de uma voluptuosa aluna sentada na
primeira fileira, tendo caído dentro de seu muito generoso decote. (Agora,
depois que voltei da suspensão, só permitem que eu ministre aula usando uma
corrente que prende minha perna à parede, impedindo, assim, maiores saltos na
minha imaginação.)
Bom, acredito que agora já
esteja esclarecida a minha total inocência nesses lamentáveis fatos, dos quais,
aliás, não me lembro de nada. Depois de quinze anos de análise, não tenho mais
nenhum problema em assumir a responsabilidade pelos meus atos – desde que, é
claro, meu corpo não esteja possuído por um espírito zombeteiro.
05/12/2011